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Chegam os cubanos

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Seis anos depois da excelente exposição dedicada ao trabalho de Emory Douglas para o Black Panther Party, a galeria ZDB (Zé dos Bois) em Lisboa entra de cabeça na divulgação do quase inesgotável manancial da propaganda cubana, no caso para a agência OSPAAAL (Organización de Solidaridad de los Pueblos de África, Asia y América Latina) entre 1960 e 1980, o pico da influência político-militar cubana no terceiro mundo, na qual a qualidade desta propaganda teve um papel não despiciendo.

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Se a ligação de uma para outra exposição é lógica e pertinente (Douglas fez alguns belos cartazes para a OSPAAAL, sendo o único designer/artista gráfico norte-americano convidado para tal), e o singelo e arejado espaço da ZBD volta a ser bem aproveitado para fazer brilhar estas peças, há pequenas coisas que, creio, não se pode deixar passar no caso de uma exposição que, como esta (e ao contrário da de há seis anos), se insere numa programação cultural oficial, num destes “eventos” já ubíquos por toda a Lisboa e durante todo o ano, no caso o da Capital Ibero-americana de Cultura 2017. Não há qualquer informação escrita junto às peças (o orçamento disponível – que não creio ter sido baixo, dados os apoios que o cartaz anuncia – não deu para umas legendas em vinil na parede e em papel nas vitrinas?), e a folha de exposição tem muito pouca. Não há nem uma reprodução de um destes cartazes à disposição do visitante para comprar e levar para casa (e se há cartazes que foram feitos para serem “levados” e disseminados são estes). Faltaram à chamada cartazes histórica e esteticamente importantes, como o do “Dia da Guerrilha Heróica” de Elena Serrano (1968), o “Cristo guerrillero” de Alfredo Rostgaard (1969) ou um dos cartazes de Olivio Martínez para a campanha da colheita dos 10 milhões de toneladas de cana de açúcar (1970). Para além dos exemplares da Tricontinental, nem um livro ou exemplar de outras revistas ou jornais cubanos do período (Bohemia, Cuba, o influente suplemento cultural “Lunes de Revolucion” do jornal Revolución, etc) que contextualizasse esta produção. Nem uma fotografia dos artistas gráficos durante aqueles anos (alguns dos quais, é certo, saíram de Cuba e poderão ter-se tornado “personae non gratae”), ou dos seus ateliers, ou das gráficas, tanto em offset (um luxo em Cuba por então, reservado quase em exclusivo para estes cartazes de propaganda internacionalista) como em serigrafia, e de quem lá trabalhava. (Caso a ZDB queira e consiga repetir a proeza com os cartazes do ICAIC – o pináculo da escola gráfica de Cuba –  espera-se, pelo menos, que corrija o que ficou apontado atrás.)

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De resto, a exposição vale mesmo pela beleza destas peças (com uma surpresa pelo meio: a maqueta de um painel “tridimensional”), entre o aparente “naif” e o sofisticado (alguma da melhor arte Pop e mesmo psicadélica dos anos 60 foi produzida em Cuba), feitas com poucos meios ou quase nenhuns e a milhas de distância pastoso “realismo socialista” que a China e a URSS impunham como estilo de representação visual na propaganda impressa nos países da sua esfera de influência (em Testimonios del Diseño Gráfico cubano 1959-1974, uma edição de 2010 coordenada por Hector Valverde, César Mazola Álvarez conta que uma exposição de cartazes e livros cubanos que estava para ser inaugurada em 1969 em Tirana, capital da Albânia, “no se pudo montar porque el país receptor determinó que los carteles y libros no eran representativos del realismo socialista”). Quase cinquenta anos depois da “descoberta” dos cartazes cubanos em Londres, numa exposição na Ewan Phillips Gallery em 1968 (tendo o museu Victoria and Albert arrebanhado imediatamente todo o conteúdo da mesma, o que explica, por exemplo, que do livro de John Barnicoat de 1970 Posters: A Concise History, da colecção “World of Art” da Thames and Hudson, constasse já a reprodução de um cartaz cubano), a ZDB trouxe finalmente (e não digo pela primeira vez porque não sei se é de facto) uma parte de leão da “grafica cubana” a Portugal com uma exposição de material importante (até historicamente, dado o envolvimento de Cuba nas lutas de libertação nas ex-colónias portuguesas: Angola, Moçambique, Guiné e a figura de Amílcar Cabral, por exemplo, foram o objecto de muitos destes cartazes).

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“What we want”

Algumas imagens da excelente exposição “All Power to the People” dedicada ao trabalho gráfico de Emory Douglas para o Black Panther Party nos anos 60 e 70 do século passado. Sendo mais uma tentativa de contextualização estética e política do movimento radical afro-americano do que uma mostra centrada em Douglas, é um muito bom mergulho nesse caldo de imagens que procuravam o impossível: a fusão da serenidade icónica com a urgência do apelo às armas e à resistência. Pecará, talvez, pela falta de um catálogo ou pela legendagem com identificação de cada uma das imagens expostas, mas compensa essa falta com uma soberba aplicação das imagens do artista gráfico ao longo do espaço expositivo de dois andares. O mais perfeito seguimento a esta exposição seria uma dos cartazes cubanos pós-revolução: afinal, Douglas teve o apoio da OSPAAAL cubana e acabou por fazer alguns cartazes para eles, além de que a influência do grafismo cubano no seu trabalho é óbvia (e reconhecida pelo próprio). Agora sei que só a Zé dos Bois poderia (finalmente) trazer a Lisboa essa exposição.

“WHAT WE WANT”
Images from an exciting exhibition of Emory Douglas‘ graphic work for the Black Panther Party in the 1960s and 70s. It’s being shown in Lisbon, at the Zé dos Bois gallery, until the 4th of June. Do drop by to see it if you happen to drop by in Lisbon in the meantime.

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